Discurso de ódio misógino: representações, impactos e intervenções

Eds:

Rita Basílio de Simões, Universidade de Coimbra, Faculdade de Letras/ICNova Instituto de Comunicação da Nova, Portugal
Inês Amaral, Universidade de Coimbra, Faculdade de Letras/Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade, Portugal
Sonia Núñez Puente, Facultad de Ciencias de la Comunicación, Universidad Rey Juan Carlos, Madrid, España

PRAZO PARA A SUBMISSÃO DE ARTIGOS: 
29 MAIO 2023 (a publicar em dezembro de 2023)

Resumo:

Apesar das crescentes preocupações com o aumento da prevalência do discurso de ódio misógino ou sexista em diferentes plataformas digitais populares (e.g. Ging e Siapera 2018, 2019; Vickery e Everbach 2018), a investigação neste domínio é relativamente recente e tem gerado, sobretudo, evidências dispersas da sua ocorrência, dos seus impactos individuais e consequências culturais e democráticas. Sabemos que o ódio misógino se intersecta, com frequência, com outras expressões de intolerância e outros tipos de abusos perpetrados com recurso à tecnologia, incluindo assédio, perseguição, ameaças e ofensas verbais, que afetam desproporcionalmente as mulheres (Duggan 2014; FRA 2014; EIGE 2017; Vogels 2021), mas é ainda limitada a compreensão das maneiras pelas quais o ódio é expresso e percebido.

A atenção dirigida às formas de combater o ódio online é ainda mais recente. Os estudos feministas e de género sugerem que os domínios socioculturais e tecnológicos são mutuamente constitutivos e que, por isso, as práticas tecnologicamente mediadas reproduzem hierarquias e privilégios cristalizados, mas também são molas propulsoras de novos fenómenos, como o pós-feminismo, o antifeminismo, os movimentos masculinos ou as masculinidades tóxicas. Como este conhecimento é operacionalizado por atores sociais de relevo para pensar respostas adequadas é uma questão que, com algumas exceções (e.g. Free et al. 2017; Henry, Flynn e Powell 2018), tem sido, no entanto, pouco estudada.

O trabalho científico neste domínio também não tem fornecido elementos consensuais que sustentem uma definição amplamente aceite do problema na esfera jurídico-política. A expressão discurso de ódio tem sido indiferenciadamente usada para referir vários tipos de discurso negativo, contemplando ódio e o seu incitamento, conteúdo abusivo e difamatório com base em características de pertença a um grupo social específico, incluindo formas extremas de discriminação e de preconceito (Siegle 2020).

À complexidade de criação de um quadro definitório consensual, soma-se o débil equilíbrio no reconhecimento de diferentes grupos sociais como vulneráveis ao ódio. Diferentemente do discurso de ódio racista, que é sempre considerado como contrário aos padrões europeus e internacionais de direitos humanos, o discurso de ódio sexista não é, amiúde, olhado desse prisma, situação que alguns instrumentos internacionais têm procurado contrariar (e.g. Recommendation CM/Rec(2019)1), encorajando os Estados a garantir a mesma bitola para lidar com o discurso racista e o discurso sexista, em particular no que diz respeito à intervenção da lei.

Este número temático, subordinado ao tema “Discurso de ódio misógino: retratos, impactos e intervenções”, tem como objetivo proporcionar um espaço de aprofundamento do conhecimento sobre como o discurso de ódio sexista que circula em ambiente digital é expresso, percebido e enfrentado. Interessa-nos particularmente investigação interdisciplinar conduzida a partir de abordagens feministas centrada em estudos que produzam evidências empíricas referenciáveis a diferentes contextos internacionais. Serão também bem-vindos estudos que reflitam criticamente sobre os desafios teóricos, metodológicos e políticos que o discurso de ódio coloca aos feminismos. Apelamos, pois, a contributos que se centrem preferencialmente nos temas seguintes:

  • Expressões do ódio sexista em plataformas digitais;
  • Antifeminismo, masculinidades tóxicas e normalização do ódio;
  • Movimentos extremistas e ódio misógino;
  • Discurso de ódio e interseccionalidade;
  • Perceções de vítimas/sobreviventes, testemunhas e stakeholders do ódio sexista;
  • Ativismo feminista e misoginia online;
  • Políticas públicas de prevenção e combate do ódio sexista online;
  • Outras intervenções dirigidas ao discurso de ódio;
  • Contextos de produção do ódio sexista;
  • Misoginia em rede durante e após a pandemia de COVID-19;
  • Discurso de ódio e desafios epistemológicos e metodológicos.

Esta lista não pretende ser exaustiva. Encoraja-se a apresentação de outras propostas que se enquadrem no tema do dossiê. Aceitam-se textos em português, inglês, espanhol e francês.


Referências Bibliográficas

Duggan, Maeve. 2014. “Online harassment”. http://www.pewinternet.org/2014/10/22/online-harassment.

EIGE. 2017. “Cyber violence against women and girls”. https://eige.europa.eu/publications/cyber-violenceagainst-women-and-girls.

FRA. 2014. “Violence against women: an EU-wide survey”. https://fra.europa.eu/sites/default/files/fra_uploads/fra-2014-vaw-survey-main-resultsapr14_en.pdf.

Free, Diana, Jackeline Palmer, Diana Minchala, Karen Levy, Thomas Ristenpart, et Nicola Dell. 2017. “Digital technologies and intimate partner violence: a qualitative analysis with multiple stakeholders”. Procs. ACM human-computer interaction 1, CSCW, Article 46. https://doi.org/10.1145/3134681.

Ging, Debbie, et Eugenia Siapera. 2018. “Special issue on online misogyny”. Feminist media studies 18, no. 4: 515-524. https://doi.org/10.1080/14680777.2018.1447345.

Henry, Nicola, Asher Flynn, et Anastasia Powell. 2018. “Policing image-based sexual abuse: stakeholder perspectives”. Police practice and research 19, no. 6: 565-581 https://doi.org/10.1080/15614263.2018.1507892.

Siegle, Alexandra A. 2020. “Online hate speech”. Dans Social Media and Democracy: The State of the Field,Prospects for Reform, édité par Nathaniel Persily et Joshua A. Tucker, 56-88. Cambridge University Press.

Vickery, Jacqueline R., and Tracy Everbach, eds. 2018. Mediating Misogyny: Gender, Technology, andHarassment. Cham, Switzerland: Palgrave Macmillan.

Vogels, Emily. 2021. “The state of online harassment” https://www.pewresearch.org/internet/2021/01/13/the-state-of-online-harassment..

Acesso livre para quem lê e para quem escreve.

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